Foram 10 dias levantando junto com o filho pela madrugada para que ele estivesse às 7 horas pronto, devidamente alimentado, com muito filtro solar no corpo e repelente. Lá íamos nós em um trajeto de 15 minutos de casa até o bairro Boqueirão, mas que para mim duravam longos e preciosos minutos. Cabelo à escovinha – estilo militar – surgiu no lugar dos cachinhos que ele tanto gostava. Mas, afinal, o que são cabelos? Crescem. Até aí, o rito de passagem do Bruno de 2018 para o Bruno 2019 não importava muito.
A calça jeans mais larga – àquela que ele ia doar porque não usava há meses – a camiseta totalmente branca, o cinto de couro, emprestado do pai, e o tênis preto, apenas confortável, vieram compor um dia a dia despojado. Primeira lição, com certeza. Deixá-los longe da vaidade; de certa forma como iguais – era difícil identificar quem era quem quando chegava para deixá-lo no quartel – e tomados de um mesmo desejo: que o ano fosse leve e que as histórias de caserna com trotes e humilhações passassem longe.
Dos 60 meninos que faziam parte do 3. Batalhão de Artilharia do 5.° GAC, 55 tinha se alistado com o desejo de ficar. Os outros cincos – entre eles o Bruno – não eram voluntários. Na segunda peneira, ao longo da semana, fiquei na torcida silenciosa para que não o quisessem. Nada! O menino caiu nas graças. Ao longo dos 10 dias de idas e vindas, ficaram apenas 54. O Bruno sendo o único não voluntário.
Mas, Bruno é Bruno. Resiliente, entre os treinos que fazíamos na praça com cronômetro na mão para vibrar quando ele conseguia completar o tempo, o meu menino homem aceitou o desafio de 2019 com os olhos de quem acredita no ser humano, e em si mesmo. “Sim, vou aprender e vou sair melhor”. Meu medo não era dos novos companheiros de rotina, os quais acompanhava os relatos de atos de bondades, de companheirismo e sentimento de grupo – uma grande e boa surpresa e esperança de que uma nova geração está se formando -, meu receio eram dos superiores, das exigências além do limite do tolerável e da falta de respeito. No entanto, como mãe aceitei sua vontade, incentivando, apontando caminhos, lembrando quesitos de liderança e todos os quetais que aprendi ao longo de tantos anos. “Vai dar certo” virou meu mantra.
Eram nessas corridas que mais trocamos ideias. Olhamos no olho com o medo do desconhecido; com a surpresa e muita, mas muita curiosidade. “Não vejo a hora que chegue o dia para eu ver qual é a real”, brincava ele, porque ele sabia que seria colônia de férias.
Além dos bons sentimentos do grupo que estaria junto com ele nesta jornada, tive outras surpresas. “Não estamos aqui para humilhar vocês e nem fazer trote, estamos aqui para ensiná-los para a vida”. Quando ouvi, suspirei inevitavelmente, na torcida de que o discurso fizesse parte da rotina.
Afinal, o ideário aponta que o objetivo do serviço militar é “transformar em homens” os meninos que chegam aos milhares, anualmente nos quarteis. Exercícios pesados, afazeres diários de limpeza e organização, não eram problemas para nós. Ao contrário. O Bruno já tinha uma mostra porque meu apelido em casa – e para algumas pessoas com quem trabalhei – é ser “um sargento”. A força dos limites, era minha apreensão. Nós, pais, estaríamos preparados?
O primeiro dos limites era ficar imerso durante 40 dias dentro do quartel, sem comunicação com o mundo externo, a partir da quarta-feira de cinzas. No entanto, as preces nos mostram o caminho, e algumas boas surpresas nos aguardavam.
Post na sequência: Fomos às compras; A formatura; e Os barracos.