13 de março. Acordei cedo. Igual a todos os dias porque a rotina não sai da gente mesmo queiramos sair dela. Os passarinhos começaram a cantar, mal raiou o dia. A animação toda só podia significar boas notícias, visita ou chuva como dizia minha avó. Preferi pensar que seria a primeira opção. Acordei “maria”, em uma ânsia de colocar os móveis para cima, limpar tapete, atucanar a cadela, me acabar de suar entre baldes e panos de chão. Quem diz que uma boa faxina não libera endorfina? Queria que a casa – que ficou silenciosa bem cedinho quando vi o marido e o filho pequeno seguirem seus caminhos – ficasse com cheiro de lavanda. Muito cheiro gostoso de limpeza.
Passando o aspirador nas almofadas, pensei por qual motivo tinha encasquetado com isso no meio da semana? Não que eu não limpe a casa todos os dias, mas naquele entusiasmo, sei lá. O último quarto foi o dos meninos… Ajeita livro daqui, tênis dali. Aquela olhadinha no armário para ver se as camisetas continuavam dobradas como tinha deixado noutro dia, senti aquele perfume… o típico de quem amamos, porque afinal cada pessoa tem seu cheirinho característico. Fui passando o nariz nos casacos e camisas penduradas, fuçando as camisetas… Cheirinho de verde, de agridoce que me lembravam o Bruno. Mesmo não querendo, lembrei-me do dia que precisei ajudar minha avó a arrumar o guarda-roupa da minha mãe, alguns dias depois que ela morreu. A sensação foi a mesma, de saudades.
Terminado tudo, casa cheirando a perfume. Um “brinco”. Vou ao supermercado para garantir algumas coisas que estavam faltando, e entrando em um corredor, vejo um casal conversando. Parei ao lado olhando as bolachas que não queria levar, mas me pareceu interessante parar ali para ouvir o que eles diziam com cara de … saudades! Parece que é o sentimento que vem me perseguindo ultimamente.
A jovem olhava para um pacote de biscoito de mel coberto de chocolate, o “beijo baiano” com um elevo muito superior ao desejo de comê-lo. O rapaz que estava levando o carrinho, balançou a cabeça como não entendendo tamanha importância para um simples pacote de bolacha, mas fazer o quê! Mas curiosa fiquei. Descobri que a tal bolacha lembrava a avó que tinha falecido há alguns anos. Toda vez que a jovem ia visitá-la, no interior, era o lanche preferido. Acabei levando o pacote de bolachas para casa também em solidariedade a saudosista.
E vinha mais história. No fim da manhã, o marido voltou da rua. Chegou dizendo “matei duas saudades!” com aquela cara característica que parece que era a “roupa” do dia. Em meio a uma escova de cachorro e talco antipulgas, sentada na porta da sala, o vi sentando na rede. Tinha ido entregar um material em um supermercado do Bacacheri e lembrou-se que próximo tinha uma pastelaria que gostava de frequentar há muitos anos. Fazendo o tempinho para descobrir se o japonês, dono daquela pastelaria especial, ainda continuava no mesmo endereço ganhou o dia quando encontrou a porta aberta e o letreiro na frente.
Era o mesmo dono, a mesma decoração, o mesmo cheiro característico de pastel frito e café feito na hora. E para surpresa, encontrou três soldados no balcão. Foi se chegando e olhando a farda para descobrir se eram do mesmo batalhão do exército que tinha servido há 40 anos. Sim, eles eram do 20.° BIB. Como todo pai coruja – e digamos que estamos em um período que qualquer verde que vemos na rua, acende a luz, “é uma farda?”- contou que o filho estava servindo no Boqueirão. Para amenizar, marido resolveu dizer que os tempos agora são outros, sem muita exigência, bem diferente de décadas atras esperando uma confirmação para acalmar o coração de agora pai, não soldado. Sem chances. Os guris fardados deram aquela risadinha marota e reafirmaram. “Não, as ‘as coisas’ continuam a mesma dureza”. Tudo bem, ele me disse, tentei.
Mas, descobri cedo de que não seria um dia de boas notícias. Em uma escola de Suzano, interior de São Paulo, cinco alunos, um funcionário e 17 alunos feridos em atendimento após o tiroteio cometido por dois adolescentes, que cometeram suicídio. Uma grande tragédia. Assisti ao vídeo e imaginei o horror dos pais desses adolescentes, pouco mais velhos do que Hugo, com 13.