Em frente da minha casa tem um poste de luz. E dezenas de fios emaranhados de tudo que se pode imaginar. Uma bagunça. No alto deste poste, tem uma casa de João de Barro. Em dois anos, “meus olhos de ver” perceberam tantas e tantas vezes que um funcionário descuidado – ou nem tanto, mas por maldade mesmo – derruba a pequena casinha, construída de barro e palha, que jaz hora e outra desmanchada na calçada. E o que faz o pequeno pássaro? Se aboleta no fio mais alto, solta o canto característico e vai em busca de novas palhas secas e barro úmido. Um exemplo de resiliência.

Devem estar se perguntando o que tem isso a ver com quartel ou com ser mãe de recruta? Tudo. Não à toa olhei para o alto e mirei o céu azul, limpo, nesta segunda-feira de outono. Dizem os antigos que depois da tempestade, vem a bonança, não é mesmo? Passamos dias atribulados com enchentes físicas e morais. Na gangorra do dia a dia, do girar da roda gigante e do frio no estômago do Chapéu Mexicano chegamos a conclusão que frequentar esse parque de diversões chamado vida não é fácil. Nem sempre temos a valorização que imaginamos merecer; nem sempre conseguimos provar que ser bom vale a pena; que justiça pode virar sinônimo de espião; que o que é bom em um dia, não é mais no outro quando chega a sua vez; uma decisão pode ter “dois pesos e duas medidas”, e que o barco segue a maré conforme o manejo. Mas, no funil tem duas palavrinhas te esperando. A esperança e a resiliência.

Quando olhei o céu azul, percebi que é tempo de pensar, mas também é tempo de olhar para trás e entender que a vida pode nos pregar peças, mas precisamos seguir o caminho. É tempo que nos faz pensar: “e se fosse comigo, o que faria?” A tal resiliência do João de Barro.

A metáfora do reconstruir nos dá conta que o pequeno pássaro tem a capacidade de se adaptar à má sorte ou às mudanças. Ele tem a paciência que nos falta muitas vezes. A cada dia ele traz no biquinho um pouco de barro úmido e vai socando, moldando a casa para ele e sua companheira. Tudo em busca da tal segurança que buscamos todos os dias.

Assim como para os passarinhos, o conceito de segurança é muito relativo. O João de Barro vê sua casa invadida por outros pássaros intrometidos. Chega a brigar com bicadas. Tudo para manter a vida dos filhotes intacta. Mas, precisa ser sábio para entender o tempo certo de construir; de se unir; e de destruir.

A natureza nos ensina. Quando derrubam a casa e impedem o ciclo natural da vida, lá vai o casal construir com tenacidade e paciência uma nova casa. Para mim, foi uma lição. Nada na vida é em vão. A cada percalço, a cada vitória ou derrota sei que essa vidinha é repleta de recomeços e que precisamos estar preparados todos os dias. Pode ser uma rasteira atrás da outra. Igual a casinha do João de Barro quando ele chega e só vê um monte de barro.

Uma hora tudo parece bem. Os planos se concretizam; os amores aquecem; os dias trazem paz. No outro, o vento vem rápido – ou um funcionário qualquer sem paciência – e bagunça tudo. Leva os alicerces e obriga você a reconstruir mais uma vez. E mais uma vez. E novamente. Como o casalzinho penoso, vamos em busca do barro úmido e voltamos a construir e a recomeçar.